Em 2020, o primeiro lugar na categoria de vinhos Cabernet Sauvignon da Grande Prova de Vinhos do Brasil teve dois vencedores. As vinícolas Franco Italiano e Araucária dividiram a primeira colocação. O resultado ilustra como o Paraná, apesar de produzir apenas 1% dos vinhos brasileiros, tem feito as bebidas de melhor qualidade em todo o território nacional.
Fernando Rausis é a quarta geração da família produzindo vinhos e envaza anualmente cerca de 60 mil litros da bebida. A propriedade onde a vinícola Franco Italiana está instalada, em Colombo, é o lado francês da empresa, legado da parte paterna.
A parte materna da família, de origem italiana, reflete a outra vertente da vinícola, que produz cerca de 15 rótulos, entre vinhos finos e coloniais, que já receberam as mais importantes premiações no Brasil e no mundo. É o caso do Cabernet Sauvignon Sensurata, que pelo segundo ano consecutivo foi eleito o melhor do Brasil.
Rausis explica que a vinícola possui vinhedos próprios em Colombo e outros parceiros, sobretudo de agricultores familiares, nas cidades de Porto Amazonas, Palmeira, Irati e São João do Triunfo. “Nossa produção de vinhos coloniais usa uvas que são 100% paranaenses”, conta o empresário.
“Para os vinhos finos, trabalhamos com microclimas”, prossegue. “Cada um produz as uvas mais indicadas para cada tipo de vinho. Para estes, recebemos uvas daqui do Paraná, da serra gaúcha, serra catarinense, Minas Gerais. Sempre buscando a melhor uva para produzir o melhor vinho”, explica Rausis.
Os anos de 2019 e 2020 foram especiais para a vinícola. “Somos uma das empresas mais premiadas do Brasil”, afirma. Este ano, um de seus rótulos, o Paradigma Roto Cabernet Sauvignon, ficou com a medalha de bronze do Decanter World Wine Awards, concurso ocorrido em Londres e que premiou os melhores vinhos do mundo.
Em 2019, um dos espumantes feitos pela vinícola ganhou o Sabre de Ouro do Espumante Brasileiro, num concurso nacional de vinhos e espumantes que acontece a cada dois anos, promovido pela Associação Brasileira de Sommeliers. “Nosso Cuvée Extra Brut ganhou a nota mais alta pelo método champenoise, que é o mesmo método utilizado para produzir champagnes na França”, diz Rausis.
BORBULHAS
As uvas Chardonnay e Pinot Noir, cuidadosamente plantadas em uma área de 9,6 hectares da vinícola RH, em Mariópolis, no Sudoeste do Paraná, demoram cerca de dois anos para se transformarem em espumantes. A espera, porém, vale muito a pena.
Dois produtos da empresa, por exemplo, acabaram de ser premiados no Rio de Janeiro. Em outubro, o espumante Brut Branco conquistou 93 pontos no Grande Prêmio Vinhos do Brasil, a maior prova às cegas de vinhos nacionais disponíveis no mercado, e bateu o grande campeão, o chamado duplo-ouro.
Performance semelhante ao espumante Extra-Brut Branco da RH, que também terminou em primeiro lugar, mas com 92 pontos. Títulos que se juntam na estante da vinícola à medalha de prata de 2015 e à medalha de ouro de 2017.
A disputa, explica a engenheira agrônoma e proprietária da empresa, Odilete Rotava Herget, reuniu 1.309 amostras de nove estados do País. Destes, 428 eram de espumantes, os “concorrentes” da RH. “Para nós é motivo de muita satisfação e orgulho essas conquistas. Estamos nos esforçando para fazer algo que está dando certo”, diz.
Para alcançar as conquistas, o processo é cuidadoso. “Tudo começa com a uva, passando pela qualidade e exigência na produção”, informa ela, que acrescenta o solo e o clima, com insolação e índices pluviométricos na medida certa, como outros fatores para o sucesso do champagne paranaense.
CHARDONNAY
Depois de namorar um tempo com os vinhos tintos, a RH decidiu em 2008 migrar para os espumantes, ano do primeiro plantio da Chardonnay. A acidez da uva brasileira, característica influenciada pelo clima do País, foi responsável pela mudança. Escolha certeira.
Os 600 quilos de uva da primeira colheita, em 2011, saltaram para 18 mil quilos em 2020. A capacidade atual é para até 25 mil litros de espumante, mas o projeto contempla a ampliação para 50 mil litros. Atualmente são 13 mil garrafas por ano envasadas na vinícola, que ganham os mais diversos pontos do Paraná e do Brasil.
“Somos ainda uma vinícola pequena, familiar. Queremos crescer, mas crescer com qualidade. Deixar a nossa marca”, afirma Waner Herget, também proprietário da RH. Expansão que, explica, passa por ele aposentar de vez o jaleco branco de dentista e migrar definitivamente para as barricas de vinho.
A RH conta atualmente com dois funcionários fixos. Número que chega a perto de 20 com os temporários, recrutados em janeiro para a colheita e em outros momentos do ano para as podas. “O vinho sempre foi uma paixão nossa. Paixão que virou hobby e agora está se desenvolvendo”, destaca Odete, que ainda se divide entre a avicultura e pecuária, os outros negócios da família. “Depois das premiações mais gente tem ligado querendo saber da vinícola e dos espumantes. Estamos ficando mais conhecidos”, completa.
PRODUÇÃO E CONSUMO
O ano de 2020 foi decisivo para os produtores de vinhos nacionais. Mesmo durante a pandemia do novo coronavírus, que paralisou os setores de eventos, bares e restaurantes, o Brasil registrou aumento no consumo deste tipo de bebida. De janeiro a agosto foram comercializados 313,3 milhões de litros, 37% a mais do que o mesmo período do ano anterior, segundo levantamento da Ideal Consulting.
Um dos fatores é que, em virtude da alta do dólar, houve valorização do produto nacional em detrimento do vinho de países como Chile, Argentina, Itália e Portugal, por exemplo. “O desafio para técnicos, produtores e gestão pública é fidelizar esse novo consumidor, que refinou o paladar e passará a cobrar mais qualidade”, ressalta Paulo Andrade, engenheiro agrônomo do Departamento de Economia Rural (Deral), órgão vinculado à Secretaria de Estado da Agricultura de Abastecimento.
PROGRAMA
No Paraná a produção de uva está espalhada na maior parte das regiões do Estado. São 3.584 hectares dedicados à cultura, com uma produção de 53,1 mil toneladas, de acordo com o Deral. Marialva, no Noroeste, lidera o ranking estadual com uma área de 473 hectares (13% do total) e produção de 11,7 mil toneladas de uva. Os outros destaques são Rosário do Ivaí, Mallet, Cerro Azul e Bandeirantes.
De acordo com Ronei Andretta, coordenador técnico do Programa Revitalização da Viticultura Paranaense (Revitis), a Secretaria de Estado da Agricultura de Abastecimento (Seab) fez um levantamento junto às agroindústrias que utilizam uva e existe uma perspectiva de aumento de 60% da demanda da fruta para vinho e suco até 2024.
“Temos verificado uma diminuição da área plantada. Em 2010, eram 6 mil hectares em todo o estado. Hoje, são cerca de 4 mil hectares. Enquanto registramos queda na área plantada, há um aumento da capacidade instalada de produção das agroindústrias. É por isso que o Revitis foi criado, para fomentar a retomada da cultura da uva no Paraná”, explica Andretta.
Atualmente, o Paraná produz 60 mil toneladas de uva, o que representa 3,6% da produção nacional e 1% do vinho feito no Brasil. São 28 grandes vinícolas no Estado, sendo que muitas delas vendem seus produtos direto na propriedade.
EIXOS
Para tentar mudar esta realidade, o Revitis foi criado para apoiar toda a cadeia produtiva. O programa se desenvolve em quatro eixos: produção, agroindústria, comercialização e turismo. Em produção, pretende-se promover capacitações para técnicos do setor público e privado, visando à qualificação e ampliação da assistência técnica.
Ao mesmo tempo, será reforçada a orientação aos produtores e criadas unidades de referência pelo Paraná, onde haja troca benéfica de experiências.
No eixo da agroindústria, o objetivo é agregar valor à produção primária, para fortalecer a cadeia, gerar empregos e renda e ampliar o mercado, sobretudo para pequenas indústrias. E, fomentando o turismo nas vinícolas de todo o Estado, potencializa-se a venda dos produtos, incentivando o consumo da uva e seus derivados.
FAMILIAR
O agricultor Felix Eudes Moleta sempre plantou fumo. Mas ter um parreiral era seu sonho. No entanto, o sustento da família vinha da fumicultura. Faz 22 anos que ele começou a plantar as primeiras parreiras. “Aos poucos, comecei a fazer a transição. Fui aumentando o parreiral e diminuindo a plantação de fumo”, conta. Há dez anos ele implantou a vinícola e começou a produzir vinho.
São 2,5 hectares dedicados ao parreiral, que rendem cerca de três toneladas de uva rosada e branca anualmente, além de 1,4 tonelada de uva bordeaux, que é utilizada para produzir o vinho e suco. “Produzimos de 12 mil a 16 mil litros de vinho por ano. Hoje, nosso produto está mais disponível em Prudentópolis e municípios vizinhos. Mas nosso objetivo é expandir os pontos de venda”, afirma.
A produção dos Vinhos Moleta é totalmente familiar. Felix trabalha com a esposa e o filho no parreiral. “Para pequenos produtores como nós, o melhor jeito é levar nosso produto para feiras. Isso torna nosso vinho conhecido, as pessoas conhecem a qualidade do que produzimos e vão comprar o produto”, afirma.
A vinícola também recebe turistas, que visitam a cidade para conhecer as famosas cachoeiras da região. Além de conhecerem um pouco mais do processo produtivo, degustam as bebidas e quase nunca saem de mãos vazias. Uma pequena loja instalada na vinícola garante que todo visitante que passe por lá volte para casa com algumas garrafas do vinho Moleta.
Fonte: Agência Estadual de Notícias do Paraná