O VULCÃO QUE TODOS TRAZEM DENTRO DE SI

Certa vez, na Ilha de Santa Lúcia, no Mar do Caribe, estive próxima da cratera de um vulcão ativo. Senti medo e me dei conta do perigo silencioso que reinava nos arredores; logo saí dali, em busca de território mais ameno e mais seguro. Mas nunca tinha sentido com tanta intensidade a alma de um vulcão, como agora, quando estive diante do Etna, na lha de Sicília, na Itália, um vulcão que está em atividade há mais de dois milhões de anos, e, perene, continua lá soltando sua fumacinha branca.

Quando chegamos em Catânia, a capital da ilha, já foi possível deslumbrar a figura majestosa daquela montanha isolada, sozinha na paisagem, com o pico coberto de neve. Parece, ao longe, sereno, tranqüilo e aparenta ser apenas um desenho bem distinto no horizonte. O céu estava azul e brilhante, sem nenhuma nuvem e o Etna mostrava que estava vivo no seu incômodo silêncio. Apenas uma nuvem branca, resultado da condensação entre frio da temperatura ambiente e o calor da cratera, denunciava que ele estava vivo, marcando presença na paisagem de forma assustadora com seus 3.340 metros de altura, com sua base perimetral de 150 quilômetros. Ficamos ali admirando as oliveiras que são cultivadas em seus arredores, em terrenos férteis e as muitas árvores frutíferas típicas mediterrâneas. A região é densamente povoada, mas quando o vulcão entra em atividade, expelindo lavas e extratos do magma, parecendo uma massa de pão incandescente, estas matérias escorrem pelo Valle Del Bové, um lugar totalmente despovoado e sempre recorrente de perigo. Mas o Etna já fez muitos estragos ao longo de sua história, sepultando aldeias, chegando com suas lavas incandescentes até o mar, matando muitos habitantes. Depois que as lavas se resfriam ele brinda à natureza deixando atrás de si terrenos férteis para o plantio de vinhedos e oliveiras. Quando em atividade o Etna é amedrontador.

E nós também somos, nós seres humanos, quando nossas queixas interiores, nossas decepções com a vida, nossas mágoas explodem queimando tudo a sua volta. Você já não se sentiu um vulcão alguma vez? Se respondeu o contrário está enganando a si próprio. Trazemos no interior de nossa alma um vulcão sempre em atividade que busca o espaço para jogar suas lavas para fora, porque o espaço de nosso coração é pequeno para conter todas as nossas inquietações. O desabafo que fazemos de vez em quando serve para saciar a explosão do vulcão que está prestes a se movimentar dentro de nós. Devemos conter estas lavas em nosso peito e manter as aparências? Sim, algumas vezes é necessário para se manter a boa convivência. Mas outras tantas, se não explodirmos, se não deixarmos a lava inflamante rolar para fora, ficamos sem ar, comprometendo nossa própria inquietude, e nossas próprias contradições. Cada vulcão que trazemos dentro de nós explode ao seu tempo e lugar. Uns dão prejuízo, porque as palavras se transformam em torpedos doloridos. Uns mais ainda com seus atos nos destroem como fogo no álcool. Mas há outros mornos que são alerta para que o GPS de nossa vida nos dê nova direção.

Que nossas erupções vulcânicas sejam sempre para o bem e que o nosso semelhante possa delas se beneficiar, sem sair com a mínima queimadura.

Izaura Varella – viajante